ÀS MOSCAS, COMO SEMPREVictor Hugo: Voltando...
Nicholas Urameshi: Às moscas, como sempre.
Victor Hugo: O caramba, eu tava trabalhando!!! Às moscas está você que não traduz Shinji, o Casanova.
Nicholas Urameshi: E daí? Eu sou só um personagem. Pior, um heterônimo. E o Nathan, cadê?
Victor Hugo: A coluna que eu ia escrever pro
Beco acabou virando esse fic escrito e estrelado pelo Nathanael, ainda sem título:
Londres, 12 de agosto de 2003"E o povo tem o que quer, mas eu não quero nada que essa sociedade tem...""Nathan, sai do chuveiro!"
"Já vai, mãe, já vai!..."
7 horas, e esta casa já se agita como os motores no tráfego lá fora. Não gosto do barulho que os carros fazem. Saudades...
"Ei, esse café sai ou não?"
"Tenha um pouco só de paciência, Nash!"
"Crosby, viu meus óculos?"
"Ora, estão na sua testa, Fischer!"
"Oh."
Pelos ruídos da rotina, Crosby e Nash já estão devorando seu café. Enquanto me enxugo e ponho a roupa com pressa, dá pra imaginar os dois senhores de boné e camisa xadrez, um calvo e o outro com cabelos brancos que vão até a nuca e o pescoço, devorando uma porção generosa de bacon com ovos; eles não saem de casa pra trabalhar sem sua dose de colesterol. Saio do banheiro e Fischer também está como sempre: comendo devagar; seu corpo franzino recostado na cadeira enquanto lê o jornal, a brisa do ventilador agitando nos cabelos grisalhos e ralos. Saudades...
"Sua careca está úmida, Nathan, vai pegar um resfriado."
"Estamos no verão, esqueceu, mãe?". Sento-me à mesa. "Nunca pensei que fosse torcer pra que chovesse. Que tem no jornal, Fischer?"
"O repórter da BBC confirmou tudo que o David Kelly havia dito. Agora sim o Blair está ferrado de verdade."
"Bem feito. Mas eu não gostaria que isso tivesse custado a morte do pobre homem. Eu continuo dizendo que tem coisa errada nessa história."
"Nathanael, é muito difícil não ter sido mesmo suicídio, sabe..." Fischer lança a mim aquele olhar de 'esperem os dois saírem'.
"Ora, esqueçam isso. Não vai acontecer nada com o Blair... nem com o velho Bush, infelizmente." Crosby resmunga enquanto termina de comer seu bacon, sem ligar para o longo fio prateado que pende do último pedaço que ele leva à boca. Me esforço pra não rir alto. Saudades...
"Como assim, infelizmente?" Nash retruca em voz alta, enquanto assiste às notícias na televisão. "Deixe os dois em paz, você ainda está rancoroso por causa da guerra..."
"Por causa dessa guerra e de todas as outras. Sofri o diabo na Coréia, fui ferido no Vietnã, me serviu pra quê?... Vamos. Tchau, Helen, lembranças ao Tim."
"Você precisa ser mais patriota... Charles, meu jornal, sim?" Nash estende as mãos para pegar o jornal que Fischer lhe atira. "Até a noite!"
"E você precisa ser menos burro! Seu filho morreu no Golfo, droga!" Crosby pragueja enquanto eles caminham pelo corredor, passando pelo saguão de entrada e indo até a garagem. Ficamos esperando, minha mãe servindo omelete nos dois pratos ainda limpos, Fischer ainda lendo o jornal enquanto eu como, mas todos esperam até ter certeza de que o carro partiu. Saudades...
"E o Profeta?" minha mãe olha ao redor da mesa e pelas prateleiras, ao se sentar à mesa.
"Tive que sentar em cima dele para os dois não verem nada." Fischer retira de baixo de si um exemplar do Profeta Diário, mais fino que o normal.
"Cadê o resto?" Me levanto; não tenho muita fome ultimamente. Saudades...
"Seu pai levou pro quarto quando Nash veio comer".
Crosby e Nash vieram do sul dos Estados Unidos; moram conosco desde que me conheço por gente e são sócios da Crosby, Stills, Nash & Young Transportes. Os outros dois sócios trabalham sediados em Manchester. Crosby lutou nos conflitos da Guerra Fria e é um democrata decepcionado; Nash, republicano convicto, nunca botou a mão numa arma mas defende o direito ao porte. Nenhum deles desconfia de nós. Saudades...
"As mortes no Iraque continuam.", ecoa uma voz do corredor; meu pai vem à sala e se senta à mesa. Ele já fez de tudo na vida: pilotou um tanque na Alemanha no final da guerra, foi caixeiro-viajante, trabalhou na indústria de Manchester até ela finalmente murchar como toda cidade industrial que se preze depois dos anos oitentas. Parece que ele murchou junto: eu vejo as fotos de quando ele era jovem e é difícil reconhecer naquele homenzarrão em preto-e-branco o senhor baixinho e bigodudo, de modos suaves e barba por fazer, que conheci a vida toda. Saudades...
"O Fudge deve estar se arrependendo de ter apoiado Blair, já é o quinto bruxo da missão do Ministério que morre." Minha mãe Helen tem a mesma idade do meu pai, mas parecer ter menos. Ela é bem longeva, mesmo para quem nasceu trouxa: muitos dos bruxos nascidos em famílias não-mágicas não costumam morrer de velhice, mas a genética, em conjunto com a magia, a agraciou com uma beleza que só há poucos anos começou a desvanecer, deixando rastros de prata nos cabelos ruivos e cacheados. Uma bruxa muito boa, poderia ter trabalhado em qualquer coisa que quisesse com magia, mas quando meu pai não conseguiu mais nenhum emprego, preferiu não deixá-lo para trás e montou junto com ele esta pensão. Foi mais ou menos nos anos oitenta, quando eu nasci. Saudades...
"O
excelentíssimo Ministro está ocupado demais para isso, não?" Fischer usa um tom muito irônico, enquanto leva seu prato para a pia. Ele tem razão em ficar bravo ao se lembrar de Ministro: perdeu o emprego ao não concordar com a política de esconder a volta de Você-Sabe-Quem. Ele levou por muito tempo uma vida dupla entre as universidades e o trabalho de relações com trouxas no Ministério; ficou tão desapontado quando foi demitido que não saiu da Londres dos trouxas desde então. É o único bruxo que conheço que sabe mexer com computadores. Ele parece não se importar, mas assim como eu, sente a falta do contato. Saudades...
"Tem razão, Charles, ele tem muito o que consertar se quiser ser reeleito. Você está quieto demais, filho." Meu pai nota ao olhar por cima do jornal. Eu finjo examinar minha roupa enquanto me olho num espelho na estante da copa. Um pequeno sorriso ao lembrar que estou numa forma física decente e meu rosto estava bem cuidado, não mais parecendo que eu havia acabado de acordar de uma noite mal-dormida. Embora a genética não tenha sido tão gentil com meus cabelos quanto com minha mãe, a cabeça nua não me deixa feio. As garotas me achavam bonito na época da escola.
"Saudades..." eu suspiro.
"...de Hogwarts." Todos dizem em voz alta.
Eu me volto a eles. "Está tão na cara?"
"Claro que está." Fischer se levanta com o jornal nas mãos; a campainha toca e meus pais saem da sala de jantar pelo corredor. "Você está assim desde que se formou: com saudade do tempo que as coisas eram fáceis."
"Tenho motivos, não?"
E tenho mesmo. Faz quatro anos que me formei e nunca consegui durar mais de seis meses num emprego. Tive boas notas nos NOMs e nos NIEMs, costumo ser competente no que faço, mas os chefes não me suportam (ou sou eu que não os suporto, segundo o Fischer). No mundo mágico, o finado Bartô Crouch foi o pior chefe que eu já tive.
"Você sempre pode implorar para o Professor Solomon."
"Prefiro tomar uma maldição na cabeça!"
Mas o Professor Solomon consegue ser pior. Já teve um chefe que não sabe o que quer, que parece destinar a existência apenas a fazer da sua um inferno? O típico caso de bom professor e péssimo administrador. Não sei por que o Fischer sempre me fala pra pedir meu emprego de volta: ele mesmo não gosta nada do Solomon.
"Seria mais fácil se você conseguisse ser eleito para chefe do departamento." Fischer tenta se eleger há três anos, mas o Solomon sempre ganha.
"Mais fácil? Ele atrapalha minha carreira justamente para que eu não seja eleito. Acho que vou é me candidatar a coordenador de curso, o Marr está de mudança..." ele suspira. "Saudades..."
"Ahá!"
"Não aponte esse dedo para mim, que estamos falando é de você. Você vai ou não vai pedir o emprego de volta a Solomon?"
"Em último caso! Estou esperando uma resposta."
"Aquela resposta? Você está brincando?" Fischer parece escandalizado. "Eu não consigo imaginar você numa sala de aula, encarando os alunos."
"Ah, meu caro Charles..." Eu procuro por uma resposta, para não deixar transparecer que não gostei nada do comentário dele. "Eu também não imagino os alunos encarando você." Ele rola os olhos. Sorrio ao conseguir o que queria: ele preza a profissão de professor mais do que quase qualquer coisa. "E eu sou competente o bastante. Pelos meus NIEMs, seria um bom candidato a Auror; claro que não tenho chance alguma, com o Fudge no Ministério. Mas se Dumbledore e McGonagall..."
"Se depender da McGonagall, você também já perdeu essa. Mantenho o que eu disse e mais: se você for contratado, engulo minha vassoura."
Meneio a cabeça e olho pela janela, suspirando mais uma vez, enquanto Fischer se senta no sofá e continua a ler o jornal.
"Eu podia virar você do avesso... mas escolho não fazer isso..."Um ponto marrom se movendo entre as nuvens.
"Hein?"
"Que houve?" Fischer se levanta e olha pela janela.
O ponto se aproxima: uma coruja. E eu me lembro bem dessa espécie...
"Uma coruja de Hogwarts! Vamos ver quem está certo, Fischer!"
"Que gritaria é essa?" Minha mãe vem do corredor. "Nós temos hóspedes novos!"
A coruja finalmente chega; abro a janela para ela entrar, e ofereço meu ombro, mesmo ela sendo um pouco pesada. Fischer tira a carta de seu bico.
"Preciso levá-la ao corujal." Falo em voz baixa para os hóspedes no saguão não escutarem.
"Sossegue, eles são bruxos." Minha mãe responde.
Fischer e eu entramos no corredor e descemos o lance de escadas. O nosso corujal fica num quintal, oculto dos olhos externos por muros cheias de trepadeiras. Temos cinco casinhas, mas apenas duas corujas: Apolo e Icarus, malhadas e bem criadas.
"Temos visitas, gente." Eu digo a elas. "Tratem bem dela, tenho certeza que ela me trouxe boas notícias."
"Não cante vitória antes de abrir a carta, sim?" Fischer me estende a carta enquanto deixo a coruja na casinha vazia mais limpa. Tomo a carta da mão dele com galhardia, e abro ansioso enquanto corro para dentro.
"Onde estão aqueles malditos óculos?" Outra peça que a genética me pregou foi a dislexia. Apesar de ter a vista perfeita, preciso usar óculos para ler qualquer pedaço de papel. O efeito colateral desses óculos é que, enquanto ele desembaralha as letras em minha mente, embaralha minha visão em qualquer outra coisa; é por isso que não gosto de usá-los.
Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts
Diretor: Alvo Dumbledore (Ordem de Merlin, Primeira Classe, Grande Feiticeiro, Confederação Internacional de Bruxos)
Caro Sr. O'Connor,
Recebemos seu currículo em resposta ao anúncio sobre a vaga na cadeira de Defesa Contra a Arte das Trevas. Tenho o prazer em afirmar que, dado seu excelente registro escolar, consideramos que o senhor reúne as qualificações necessárias. Faremos uma entrevista com o senhor a título de avaliação adicional. Por favor compareça ao Caldeirão Furado, às 9h do dia 29 próximo.
Atenciosamente,
Minerva McGonagall
Vice-Diretora